Um viajante francês do século XVIII desdenhou da nobreza
portuguesa, parodiando, entre outras coisas, da dimensão das suas casas, que em
França não seriam de meras famílias abastadas. Entre outros mimos.
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O Norte do país é fértil em casinhas com pedra d’armas... ou
não fosse a fidalguia estado que passasse por parte de pai e de mãe a toda a
prole, independentemente de graça ou mercê de el Rei. Mas a Quinta do Cidrô é
já uma casa nobre à séria, a imponência não engana.
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Foi casa do primeiro e único marquês de Soveral, Luís Maria
Pinto de Soveral, nascido em 1851 em São João da Pesqueira e falecido em 1922,
em Lisboa. Diplomata com grandes conhecimentos em inglês e vivência em
Inglaterra, destacou-se nessa chancelaria. O seu pai foi também célebre;
Eduardo Pinto de Soveral, primeiro visconde de São Luís. Era um homem de
cultura e amante da arte dramática, tendo mandado erigir o Teatro de São Luís,
no Chiado, que perdura até hoje.
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Hoje a Quinta de Cidrô, até há relativamente pouco tempo
chamada de Sidrô, e o palácio pertencem à Companhia Geral da Agricultura das
Vinhas do Alto Douro, vulgarmente conhecida por Real Companhia Velha. Para quem
não sabe, foi esta empresa que constituiu e demarcou o Douro vinhateiro, por
ordem de Sebastião José de Carvalho e Melo, primeiro conde de Oeiras, primeiro
marquês de Pombal e ministro do rei Dom José. A companhia foi fundada em 1756
e, durante estes mais de 250 anos, conheceu diferentes fases e funções, sendo
desde 1960 controlada pela família Silva Reis.
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Hoje, a Real Companhia Velha é uma empresa que se dedica à
produção de vinhos do Douro e do Porto, sendo um dos principais operadores,
quer em quantidade processada, quer em reputação. Entre as diversas quintas (Aciprestes,
Carvalhas, Casal da Granja, Cidrô e Síbio), a do Cidrô é uma das
principais, tendo sido constituída como um «laboratório» vivo, onde são
testadas diferentes castas e testadas abordagens de viticultura. Não sei
porquê, mas eu, que me enxofro com castas estrangeiras no Douro, não me
apoquento muito com estas diatribes da Real Companhia Velha no Cidrô... Freud
poderia explicar.
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Foi para esta casinha, um T0 de vinte e tal quartos, que me
levaram e me deram a conhecer as novidades nascidas em São João da Pesqueira.
Tenho a dizer (mais uma vez) que o espírito, ânimo e personalidade das pessoas
se transmite ao vinho. Testemunhei a amizade e prazer com que a equipa técnica
se cruza. O enólogo, Jorge Moreira, nasceu na casa, passeou pelo Douro e
regressou, o responsável pela vinha é Rui Soares (também manda na dos Aciprestes) e depois há Álvaro Martinho (responsável pela viticultura da Quinta das Carvalhas), um bem-disposto que
quando começa a falar dificilmente o calam, mas não aborrece (mesmo nada)...
ora no serão do jantar, o simpático Álvaro agarrou-se à viola e cá vai disto:
concerto longo, que só terminou quando alguém apagou as luzes,
propositadamente, do pátio interior do palácio. E canta bem! Até lhe chamaram Álvaro Dylan.
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Vamos ao que interessa e vos trouxe até aqui; os vinhos.
Foram 11 as novidades apresentadas, brancos, rosados e tintos. Fica a quinta
ainda no Cima Corgo, na fronteira com a sub-região do Douro Superior; ainda não
tem os calores. Pela sua situação geográfica, a Quinta de Cidrô não tem atractivos
para nela se fazerem Vinhos do Porto, mas tem óptimas condições para vinhos Douro.
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Nas novidades destacaram-se os estrangeirismos, razão por
que a maioria não pode ser aprovada como Denominação de Origem Controlada
Douro, tendo passado (sem qualquer mácula de qualidade) para Regional Duriense.
A saber:
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Nos brancos da Quinta de Cidrô encontrei, em maior ou menor
expressão, notas de casca de tangerina. Isto quer dizer que alguma(s)
características do local potenciam esses aromas. Brancos, rosado e tintos
demonstraram mineralidade e frescura. Estes são os traços gerais.
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Quinta de Cidrô Alvarinho 2012... blá blá blá no nariz maracujá,
flor de laranjeira, casca de tangerina; boca fresca com doçura.
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Quinta de Cidrô Sauvignon Blanc 2012... blá blá blá no nariz
casca de tangerina e finura de terra, podia ser fumo, mas não conheceu madeira.
Na boca é seco e fresco. Não costumo gostar da casta.
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Quinta de Cidrô Gewurztraminer 2012... blá blá blá no nariz
notas florais, destacando-se a laranjeira, minério, casca de tangerina,
líchias. Na boca, uma impressionante frescura e final delicioso. Para mim, a surpresa
da prova.
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Quinta de Cidrô Sémillon 2012... blá blá blá, não é
exuberante no nariz e o que prevalece é alguma confusão, com identificável flor
de laranjeira, mas lá muito ao fundo. Na boca é equilibrado. Tudo pode parecer
pouco, mas não é. Resulta bem.
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Quinta de Cidrô Chardonnay 2011... blá blá blá no nariz
mostrou manteiga e, vagamente, flores. Na boca é fresco, denso e profundo.
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Quinta de Cidrô Rosé 2012... o menos bom do conjunto. Sem
deslumbre nem argumento que o destacasse, apagou-se. Mesmo num contexto doutros
rosados, este não vai muito longe. Cumpre no critério de qualidade formal, mas
não vejo interesse em preferir este ao outros do mesmo calibre. Bom, mas sem
alma. Feito com touriga nacional, tem as virtudes de não ser «docinho» nem
quente.
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Quinta de Cidrô Rufete 2011... depois da ousadia de, em
2010, abraçar uma casta pouco valorizada e de forma estreme, a Real Companhia
Velha voltou à carga. Para mim, a audácia de avançar com um rufete, que não tem
nada de mariquices que a corrente dominante enaltece, merece aplauso. Não é um
patinho feio que se adopta com ternura, é um vinho diferente, com lugar à mesa,
com comidas precisas (sardinha assada dizem que vai bem, mas não sei, porque
não como peixe). Blá blá blá... no nariz sobressai metal e nitrato... sugestão?
Talvez, mas lembrou-me peixe, sardinhas... se calhar ando a ouvir demasiadas
estórias, mas juro que foi a impressão que me deu. Ora, não comendo eu peixe,
sobretudo por causa do odor, é compreensível que não tenha adorado o aroma
deste vinho. Porém, lembrava, de facto, o da sardinha, que é bicho que não tem
demasiada pestilência (para o meu nariz). Na boca escorrega muito bem, fresco e
perigoso. Um tinto para pratos leves e noite descontraída à conversa.
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Quinta de Cidrô Cabernet e Touriga Nacional
2007... ui! Esta é difícil. Duas grandes castas dentro duma garrafa.
Temperamento? Mau feitio? Bem, não sendo amiguinhas, dão-se bem. De início, a
cabernet sauvignon não se impõe, mas o tempo dá-lhe prevalência. Com outra
casta, a cabernet sauvignon tê-la-ia humilhado, mas a touriga dá luta. Bem, um
a zero para a francesa. Na boca, a cabernet sauvignon não dá grandes hipóteses.
Embora dominando, no geral, a casta não rebentou em pimentão, mostrou frescura,
vegetal e personalidade.
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Quinta de Cidrô Pinot Noir 2011... embora lhe atribua a
mesma nota que dei ao cabernet sauvignon e touriga nacional, este néctar
parece-me um pouco superior. Não estava à espera dum pinot noir assim. Não é
(mesmo) nada mau, antes pelo contrário, mas não me evoca os da Borgonha, muito
menos na cor. Blá blá blá no nariz mostra coisinhas que gosto muito: poeira,
lenha, um pouco de menta... é profundo sem ser perfurante. Na boca é flanela...
o tempo será generoso para este vinho, que tem uma acidez muito elegante.
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Quinta de Cidrô Touriga Nacional 2011... blá blá blá, é um
clássico! A touriga nacional, embora tendo nascimento no Dão e o mundo para
conquistar, tem casa no Douro. Não será por acaso que foi o monocasta mais
conseguido. A touriga nacional estava a jogar em casa. Ao contrário de muitos «tourigos»
durienses, este mostrou as violetas, sem abandonar um pouco de geleia de
morango. Na boca mostrou-se muito elegante e envolvente, com um longo e
profundo final. Não tenho a escala dividida em décimas, centésimas nem
milésimas... Três tintos com a mesma nota, mas não com a mesma altura. Este
está acima.
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Quinta de Cidrô Celebration 2010... sem blá blá blá, directo
ao final: grande vinho! Criado para celebrar 20 anos de viticultura moderna na
Quinta de Cidrô e na Real Companhia Velha... sei lá... é um grande vinho. Que
mais posso acrescentar? Que se fez com cabernet sauvignon e touriga nacional?
Opá! Pouco me importa! Notável nos equilíbrios entre as duas castas, uma
presença de madeira e longe de ser pau. Na boca revelou grande estrutura,
doçura, frescura, profundidade e um final quase orgásmico.
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Quinta de Cidrô Alvarinho 2012
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Origem: Regional Duriense
Nota: 5/10
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Quinta de Cidrô Sauvignon Blanc 2012
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Origem: Regional Duriense
Nota: 6/10
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Quinta de Cidrô Gewurztraminer 2012
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Origem: Regional Duriense
Nota: 7/10
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Quinta de Cidrô Sémillon 2012
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Origem: Regional Duriense
Nota: 6/10
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Quinta de Cidrô Chardonnay 2011...
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Origem: Regional Duriense
Nota: 6/10
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Quinta de Cidrô Rosé 2012
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Origem: Douro
Nota: 4/10
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Quinta de Cidrô Rufete 2011
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Origem; Douro
Nota: 5/10
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Quinta de Cidrô Cabernet Sauvignon e Touriga Nacional 2007
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Origem: Regional Duriense
Nota: 7,5/10
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Quinta de Cidrô Pinot Noir 2011
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Origem: Regional Duriense
Nota: 7,5/10
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Quinta de Cidrô Touriga Nacional 2011
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Origem:Douro
Nota: 7,5/10
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Quinta de Cidrô Celebration 2010
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Origem: Regional Duriense
Nota: 8,5/10
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