A sociedade não valoriza a idade, há todo um culto da
juventude e da beleza que enerva os gordos e entristece os velhos. Porém, no
mundo das marcas e no marketing valoriza-se o tempo, que traduz estabilidade,
sabedoria e segurança. Uma boa data impressiona sempre.
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Desde que há marcas que se valoriza o tempo, ou não fosse
uma constante a ostentação de datas nos rótulos dos produtos e tabuletas dos
estabelecimentos. Até há casos que me fazem sorrir: fundado em 1989. Foi ontem,
pá! Mostrem isso quando chegarem, por exemplo, aos 50 anos. E 50 anos é menos
duma vida humana média (no mundo ocidental).
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O mundo dos vinhos não é diferente, ou até é «mais igual».
No vinho valoriza-se a propriedade, o território, a família e a idade. Quinta de
Algures, é in. Vinho do Douro, é in. Família Fagundes, é in. Um brasão, é in.
Desde mil-e-troca-o-passo, é in. Muitas vezes acrescentam-se uns toques retrô
para acentuar o porte antigo e distinto.
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Nesta coisa do parece-que-é, dos wanna be, do quem-me-dera,
do faz de conta, até se inventam brasões ou adaptam desenhos heráldicos. Gosto
mesmo ver e ler as datas das fundações das casas… Mas não há noção de bom
senso?
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A mais antiga marca portuguesa de vinho de mesa é de 1850,
duma casa fundada em 1834 (José Maria da Fonseca). Mas mais antigas são alguns
estabelecimentos de Vinho do Porto (Croft, 1588; Kopke, 1638; Taylor’s, 1692; Burmester,
1750; Fonseca, 1822…), alguns já com décadas quando foi criada a Companhia
Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro (Real Companhia Velha – 1756). No
entanto, a generalidade desses casos respeita a sociedades que, durante muitos
anos, desenvolviam a actividade de import/export, em que o vinho era apenas
mais uma mercadoria.
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Bem, mas essas são antigas e estão ligadas ao sector. Bem,
há famílias que estabeleceram quintas há séculos, que sempre fizeram vinho,
todavia não é a data que ostentam em que o começaram a vender com marca
própria. É uma questão de rigor. A humanidade faz vinho há milhares de anos. Produz-se
vinho, no actual território português, há muitos séculos. Porquê estabelecer
uma data no século XVII? Somos todos descendentes da Eva sapiens sapiens, a
generalidade das famílias tem milhões de genes tugas, gerações e gerações a
falar português, parentescos e parentescos nascidos na pátria de Camões, do
Afonso Henriques, dos mouros, dos visigodos, dos romanos…
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Ainda ninguém se lembrou de pôr no rótulo: desde 43 AC.
Haja coragem!
1 comentário:
Tens toda a razão! Mas também sabemos que a maior parte dos consumidores olha para essas coisas... É channel! É luxo!
Nós, é que nao queremos saber disso para nada, mas sim dos vinhos em questão. E também há quem diga que a idade é um posto... E no vinho isso nao muda. Nao achas?
Forte abraço
http://raulsousacarvalho.blogspot.pt/
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