O vinho do Porto é habitualmente associado ao comércio com a Inglaterra, mas nem todas as casas exportadoras fizeram fortuna a vender para esse mercado. No século XIX, o Brasil assumiu-se como um importante comprador e muito por mérito de Adriano Ramos Pinto, que chegou a ser responsável por metade das vendas portuguesas de vinho na América do Sul.
No século XIX, as empresas exportadoras de Vinho do Porto não comercializavam apenas néctares requintados. Eram sociedades de import-export de diversas mercadorias e a Ramos Pinto não era diferente das concorrentes.
Adriano Ramos Pinto era um artista e um homem culto. Com uma sensibilidade diferente, a sua firma assumiu uma postura distinta da tradicional das empresas do Vinho do Porto. O fundador desta casa viveu à frente do seu tempo na abordagem do mercado.
A vida da empresa não parou nem ficou num mesmo patamar. Um grande salto foi dado por José Ramos Pinto Rosas, que revolucionou a viticultura duriense com a ajuda do seu sobrinho, hoje administrador da casa. Criaram uma quinta de raíz e seleccionaram as castas. Plantaram 150 hectares com cinco melhores variedades e avançaram para o vinho de mesa.
A quinta de Ervamoira é perfeita: Diversa nas altitudes, nas exposições solares e nas proximidades do rio. A vinha aqui não está em socalcos, foi posta ao alto, porque, no conceito duriense, é plana. E é tão quente que a vindima é feita em Agosto.
Criar vinhos do Porto e do Douro coloca desafios diferentes, porque são díspares os produtos que se pretendem conseguir. A enologia é uma ciência de equações com muitas variáveis, um ofício de técnica aprimorada, de mão certeira e precisa... é uma arte no que respeita a sensibilidade e intuição.
A Ramos Pinto está hoje ligada a um outro grande vinho: o champanhe. A casa Roederer tomou a empresa, mas entrou por convite. Um investidor que foi escolhido pelas semelhanças na relação com a vinha e no cuidado na feitura das especialidades.
A Quinta da Ervamoira, perto de Foz Côa, é a grande obra da casa Ramos Pinto. É resultado da inspiração, conhecimento e trabalho de José Ramos Pinto Rosas, que procurou arduamente a localização ideal. Deu com a sua quinta perfeita escondida nos rendilhados montanhosos, ainda hoje os camiões que levam as uvas para o lagar demoram duas horas para fazerem os 20 quilómetros que distam Ervamoira da Quinta dos Bons Ares.
Quando encontrou a eleita, a propriedade de 200 hectares não conhecia as vides, mas um campo de cereais. Era ainda mais um fim do mundo. O escritor Christian Seguin descobriu esse momento: «o caminho desdobrava-se em pegas azuis, chascos divertidos e inconstantes vespas. Apressava-se, sem saber, se o seu encantamento se devia à mistura de esteva, giesta e do odor da terra, ou se àquela voz que lhe segredava: “encontraste, José. É aqui”».
Na década de 90, a Ervamoira esteve ameaçada. As necessidades energéticas ditavam que se construísse uma barragem. Todas as vinhas e a memória das experiências que ali se fizeram estiveram condenadas a ficar submersas por muitos metros de água. A cultura e o património aliaram-se e as gravuras que não sabiam nadar acabaram por salvar o vinho de Ervamoira...
Noutros tempos, muito distantes, por esse ermo de encantos vinhateiros andaram homens que deixaram a sua marca. Ervamoira tem hoje um pequeno museu, onde não foi esquecida uma homenagem a José Ramos Pinto Rosas, uma trave-mestra da casa, porque o homem foi a alma da empresa.
Nota: Texto adaptado da reportagem que escrevi para o programa «Da Terra Ao Mar» da RTP 2.
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