Por vezes surpreendo-me com as certezas. Certamente por
desatenção e alguma preguiça – na vida e no vinho. Quando me esqueço, fica algo
por questionar. Felizmente tenho memória e constato esta falha.
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Vítimas disso são os vinhos Santa Vitória. Há sempre uma
razão para as coisas, mesmo que seja inconsciente. Talvez aqui seja porque o
meu sentido estético se estatela na roupagem das garrafas. Sim, penso que como
todos, os meus olhos comem.
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Há uns meses fui almoçar ao Palácio dos Arcos, hotel do
grupo Vila Galé, que é igualmente o produtor dos vinhos Santa Vitória. É uma
unidade hoteleira de charme, com património bem cuidado e banhada pelo Sol e pelo
seu reflexo na água de Entre-o-Tejo-o-Mar, cujo azul enche a alma.
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Aqui divide-se o texto. Agora está o vinho e, para lá, a
história da casa.
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Serviram-me o Santa Vitória Branco 2016 e o tinto Inevitável
2015. Se o primeiro não encaixa completamente no meu gosto – não me refiro à
qualidade – o segundo veio fundo. A responsabilidade enológica é de Patrícia
Peixoto e consultadoria de Bernardo Cabral.
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Com bastantes notas tropicais, Santa Vitória Branco 2016 mostra-se
fresco na boca. É resultado da junção de arinto e verdelho e não fez qualquer
estágio em madeira.
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O Inevitável 2015 enche a boca e demora-se. Nele se notam os
frutos vermelhos e compota da touriga nacional alentejana e o chocolate preto e
ameixas em passa do syrah – variedades em partes iguais no lote.
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Quando anda muita gente a desdenhar a madeira, com
exuberantes elogios à fruta e à flor – quantas vezes a razão é prosaica e respeita
a euros de poupança – aqui houve um estágio de 14 meses em barrica e não
retórica. Não sendo caruncho, gosto de madeira e as frutinhas e as florzinhas enfadam-me
frequentemente.
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Santa Vitória Branco 2016
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Origem: Regional Alentejano
Produtor: Santa Vitória
Nota: 6/10
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Inevitável 2015
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Origem: Regional Alentejano
Produtor: Santa Vitória
Nota: 8/10
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Não fiz roteiro de todas as casas do país, mas este edifício
é dos mais belos que conheço. Tal como a generalidade das casas nobres
portuguesas, é um palácio pequeno, em que o estilo arquitectónico lembra várias
coisas e todas reconhecíveis na estética nacional.
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Na história cabem muitas coisas: verdade, equívoco, lenda e
mentira. Pelos sítios passam figuras e figurões, gente de carne e fantasmas. Pelas
casas antigas passaram sempre reis, fidalgos caídos em desgraça, burguesia de
mérito e paisanos famosos.
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Diz-se que o Palácio dos Arcos se tornou Paço dos Arcos. Por
este paço – designação dos palácios onde pernoitou um monarca – anda a
personagem de Dom Manuel I, possivelmente o primeiro monarca que ali se deitou.
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Contam que as caravelas e naus dali partiam para o
mar-oceano. Há quem acrescente que O Venturoso ali se quedava para as ver
afastar. Como se não lhe bastassem as vistas de Belém e Restelo e a marinhagem
preferisse afastar-se mais de Lisboa. Parecem-me tão plausíveis quanto o
Castelo de São Jorge ter tido as muralhas pintadas de vermelho.
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Conta-se que, a dado momento, a casa acumulou uma nomeação
pleonástica: Palácio do Paço ou Paço do Palácio… uma das coisas. Situado na
freguesia – e vila – de Paço de Arcos, parece-me muito crível que o edifício
tenha dado o nome à terra.
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Erguido no século XV, foi mexido, remexido ou reerguido no
século XVIII, consequência do terramoto e maremoto de 1755. Sinceramente, os
meus olhos ainda lhe lêem o pitoresco do renascimento português, mas igualmente
as pedras pombalinas.
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Com tanta idade, é natural que tenha tido muitos donos.
Antão Martins foi quem o ergueu. Foi Capitão donatário da Vila da Praia, nos
Açores, o que significava, à época, elevado estatuto. Não encontrei – nem me
esforcei – o rasto dos seus proprietários, até chegar a Dona Teresa Eufrásia de
Meneses.
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Visto a senhora não ter deixado descendência, ofereceu a
casa e o seu Morgadio de Paço de Arcos ao amigo Dom Jorge Henriques, sexto
senhor de Alcáçovas – família que, na pessoa do 14º senhor, recebeu o título
condal, em 1834.
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A casa talvez tenha um feitiço, pois regularmente aconteceu
fim de descendência, passando para parentes. A última beneficiada foi a família
do Conde de Arrochela e Conde de Castelo de Paiva. Em 2001, a Câmara Municipal
de Oeiras tomou a sua posse. Em 2013 tornou-se em hotel, após obras de
reabilitação.
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O que tem isto a ver com o vinho? Sem pessoas e lugares não
há narrativa. Sem história, a vida é mais pobre. Tal como se lhe faltar o
vinho.
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