Apanhei um elevador de Redondo, aqui em Lisboa, e confirmei
que os mitos servem para iludir e serem desmascarados. Ou seja, quem diz que os
vinhos do Alentejo não aguentam a passagem dos anos engana-se.
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A Roquevale enviou-me para prova sete vinhos de Tinto da
Talha Grande Escolha, referentes aos anos de 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008
e 2010. Para quem não está ainda familiarizado com a nomenclatura vínica, a
estas degustações designam-se por «verticais».
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Para quem não é profissional da escrita vínica trata-se de
tarefa complicada. Desde mais porque o blogue é assumidamente amador, não
científico (se isso existe na prova) e subjectivo. Portanto, precisei de ajuda.
Com significativo atraso, face à data de recepção, organizou-se o momento.
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O atraso é de praticamente um ano. Lamento, mas, embora
profissional da escrita, sou apenas bloguista de vinho. Para além de mim,
participaram o Sérgio, a B., a D. e o J.
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Limito-me às opiniões manifestadas a escrever as
manifestações. Desta vez, não serão dadas notas. Por razões:
1)
Os vinhos têm diferentes idades, sendo de 2003 a
2010.
2)
Só eu e o Sérgio comentámos todos os vinhos e demos
notas de pontuação. Porém, as nossas escalas, embora decimais, não são
compatíveis, devido à minha ser excêntrica e, por isso, não é óbvia – o 3 é
positivo e é aberta como a escala sísmica de Richter.
3)
Só eu e o Sérgio comentámos todos os vinhos.
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A ordem de serviço dos vinhos não é unânime. Há quem prefira
começar pelos mais jovens e outros pelos mais antigos. Prefiro começar pelos
mais antigos, pois tendem a ser mais frágeis e seriam prejudicados se fossem apresentados
pela ordem inversa.
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No email que me enviou, a 13 de Novembro de 2015, a enóloga informou
que a marca Tinto da Talha surgiu em 1989. Joana Roque do Vale lançou o Tinto
da Talha Grande Escolha em 2003, «como uma aposta para cima a um preço bastante
acessível».
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Quanto a valores e relações entre qualidade e preço
mantenho-me fiel na não pronunciação. Cada um sabe da sua carteira, do seu
prazer, disponibilidade financeira e patamar nominal. Bem, avanço.
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Com excepção do 2003, que (penso) atingiu o seu ponto mais
alto, a generalidade destes vinhos tem ainda anos de vida pela frente. O caso
do 2006 é, para mim, interessante, pois revela já aromas terciário, mas a
frescura natural e a rugosidade fazem-me querer que será ainda motivo de
conversa.
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O Tinto da Talha Grande Escolha 2003 foi o estreante e
fez-se com touriga nacional e aragonês. Mostra positivamente sinais da passagem
do tempo, com vida pela frente. O Sérgio, que o notou com garra e secura,
sentenciou-o como um dos melhores da prova. A D. sentiu-o áspero. Para mim, este
ganhou.
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O Tinto da Talha Grande Escolha 2004 conheceu uma formulação
diferente, conjugando syrah e touriga nacional. Está mais jovem, não na
proporção do tempo, ainda com o chocolate preto, coisa em que a casta francesa
costuma ser fiel. Serviu considerou-o superior aos 2003 e eu, pelo que já se
percebeu, discordei. A D. não disse muito e, tal como em relação ao anterior,
J. e B. mantiveram-se silenciosos.
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O Tinto da Talha Grande Escolha 2005 é um lote de touriga
nacional e aragonês. Achei-o fechado e quando abriu notei-o menos vivo do que o
anterior. B. não o apreciou de todo, Sérgio colocou-o acima do 2004 e voltei a
divergir.
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O Tinto da Talha Grande Escolha 2006 é resultado de syrah e
touriga nacional, mais marcado pelos anos do que os precedentes (excepto 2003),
mostrando um agradável aroma de pelica. Elegi-o como o terceiro da prova.
Curiosamente, a opinião do Sérgio (não na tabela das preferências) foi bastante
próxima da minha. Finalmente, J. decidiu falar, para dizer que preferia o
primeiro (2003). B. achou-o «forte» (encorpado) e D. disse ser «muito equilibrado».
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O Tinto da Talha Grande Escolha 2007 é a junção de syrah e
alicante bouschet e está com frescura e gostei da sua aspereza suave. Tanto o
Sérgio como moi même colocámo-lo a meio da tabela. D. disse que era fácil de se
gostar, embora não lhe tivesse caído totalmente no goto.
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O Tinto da Talha Grande Escolha 2008 fez-se com aragonês e
alicante bouschet. Este foi o mais consensual e, se tivesse havido votação,
teria sido eleito o melhor da prova. Não fosse a minha admiração pelo estado de
vida do 2003 e seria minha preferência. O Sérgio deu-lhe a sua mais alta
pontuação. J. achou-o o melhor. D. gostou bastante. B. disse:
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– Gosto. É o melhor de todos.
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Para o Sérgio é «mais suave do que o anterior, mas não tão
rico de aromas».
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O Tinto da Talha Grande Escolha 2010 fez-se com aragonês e
touriga nacional. Quando chegou, era novidade. Provado há um mês,
sensivelmente, está jovem e promete caminhar pelo tempo. Verdadeiramente,
apenas J. falou e para lhe elogiar a acidez. A justiça do tempo é relativa. Lendo
os comentários que recolhi, terá de esperar para mostrar a personalidade.
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Nota: Estes vinhos foram enviados para prova pelo produtor.
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