quinta-feira, setembro 12, 2013

Vinhas do Cruzeiro Vinhão Escolha 2011

O bom e o mau, como o claro e o escuro, o preto e o branco, nunca (!) acontecem – mas contudo acrescento que tudo, nada, sempre, nunca são palavras tramadas. A vida é assim.
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Tenho apreço pela tradição. Não pela fantochada do folclore, mas da verdade que existe no étnico. A qualidade é um valor absoluto, mas os parâmetros de aferição não são; a escala varia, as relações afectivas pesam, a experiência de vida é decisiva, as sugestões sublinham e influenciam.
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Portanto: não gosto de Vinho Verde tinto. Tanto quanto desejo que viva pela eternidade. Não sei se quero que mude. Mudar? Para ficar outra coisa? Mudar para que os gajos que não gostam de Vinho Verde tinto passem a gostar? Não faz sentido. Num tom de brincadeira, não de cinismo, digo que quero que o Vinho Verde tinto fique como está, para que, há falta de melhor assunto, tenhamos algo com que afiar a língua.
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Este vinho dá motivo a conversa, tem muito para dizer. A Casa do Cruzeiro, uma bela residência solarenga, que outrora, antes da vila a abraçar, servia para descanso da família durante o Verão. Como seria de esperar, o domínio tem vinhas. E já agora, de quê? Vinhão e loureiro... que mais poderia ser? O vinho da de loureiro não bebi.
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Porém, este vinho não tem nada a ver com os donos da casa. As uvas vêm de vinhas que estão em terrenos que fizeram parte do morgadio. Este vinho é da Escola Profissional de Agricultura e Desenvolvimento Rural de Ponte de Lima, que também o engarrafa. Este vinho é didáctico. É didáctico para quem o faz e para quem o bebe.
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Ensina a quem nunca provou um Verde tinto onde está o portão do Inferno... mas numa suavíssima visão... o Verde tinto, entenda-se. Esta afirmação traduz-se em: «consegue ser bebido». Tem o seu gás... o amigo Paulo Rosendo hoje andou de esfregona a limpar uma cena de crime. Um mar sanguíneo... ninguém homicidiou (a palavra não existe), apenas o gás forçou a cápsula e a rolha; Bum!
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O facto de se conseguir beber não quer dizer que seja «mau» Verde tinto. Autenticidade, tem. Falta-lhe é o fulgor desabrido dos tradicionais, a loucura insana de quem sai a correr a gritar que há fogo no fim da rua, com os olhos esbugalhados e a língua a quase saltar da boca, os gestos amplos quase desacertados e ilógicos, numa velocidade vertiginosa.
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É aí a falha! Na essência é um verdadeiro Vinho Verde tinto, mas, à conta de muito sermão e porrada, deixa que «eu» o tenha conseguido beber. Defeitos mais do que desculpáveis, até por se tratar dum vinho de escola. A haver falha seria sempre do professor.
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É como o miúdo travesso que sai de manha para ir à mercearia e só volta à noite, trazendo apenas a fisga e dois pardais, que passa ao pé de freiras e diz um palavrão, mas que ao domingo, com o banho tomado e bem penteado, ouve missa e come à mesa com o padre... só porque o obrigaram!
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O Vinhas do Cruzeiro tem a cor da tinta de escrever (só que em notas encarnadas), densas, profundas, misteriosas; pouco grau (11) e tem um aroma limpo. O que não percebo é a acidez. O que fizeram dela? Está castrada.
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Não estando a dizer mal para dizer bem, não fazendo o favor a ninguém, digo que gostei com sinceridade. Defeito? Fizeram-no perfeitinho.
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Ninguém nasce ensinado e não sou ninguém para dar lições de enologia a ninguém. Se fosse eu a fazer, faria certamente muitíssimo pior.
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Conselho aos fazedores: para a próxima amordacem o professor ou anotem mal os valores que lhe fornecem e façam uma rave na adega (oiçam e dancem house, free jazz e Quim Barreiros enquanto o fazem). Partam isso tudo! Ponham o vinhão a dizer palavrões! Essa é a tradição! C******!
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Origem: Vinho Verde
Produtor: Escola Profissional de Agricultura e Desenvolvimento Rural de Ponte de Lima
Nota: X
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Nota 1: Tenho a escrita dos vinhos atrasada e este entra à fascista.