domingo, fevereiro 26, 2012

Tons Duorum Branco 2011

O tempo em que vinho barato era, no mínimo, dispensável passou, embora não totalmente, reconheça-se. Vários produtores têm surgido apostados em fazer vinhos fáceis, bons e a preço sedutor.
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Claro, que muitos continuam a fazer «o melhor vinho do mundo», muitas vezes, embora bem feitos, sem grande interesse. Lá saltam eles para os oito, dez, 12, 16 euros… Pois bem, gente séria e competente, como João Portugal Ramos e José Maria Soares Franco, garantem qualidade inquestionável e os selos marcam numerozinhos que fazem cócegas na minha carteira.
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Ao dizer isto não quer dizer que tenha cedido à tentação do julgamento da relação entre a qualidade e o preço. Mas esta é das situações em que tem mesmo de ser referenciada. Há vários vinhos bons e baratos, mas alguns são melhores do que outros. Este é um deles.
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A mim proporcionou-me um prazer surpreendente. Indiferente ao preço (sou milionário), tropecei, sem querer, com os olhos no valor recomendado… 3,99 euros (irrita-me os arredondamentos em nove). Dava facilmente seis euros por ele.
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Pois, não é a última Coca-Cola do deserto, não é o vinho mais desafiante que traguei, mas… e então? É bom, e prontes!
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Para que não protestem muito, não repito a graça, dois dias seguidos, de não meter notas de prova… Então é assim:
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No nariz mostrou-se cítrico, com casca de tangerina, fresco, mas, ao mesmo tempo, melado. Sem enjoo… o produtor fala em fruta tropical… graças a Deus passou-me ao lado… nem ananás me lembrou. Na boca foi muito fresco e prazenteiro, com um final recomendado.
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Origem: Douro
Produtor: Duorum Vinhos
Nota: 5,5/10

sábado, fevereiro 25, 2012

Lavradores de Feitoria lançam seis novidades

Os Lavradores de Feitoria apresentaram as novidades, num almoço no Pedro e o Lobo, em Lisboa. Foram seis o néctares lançados, dos quais dois brancos. No geral pode afirmar-se que se mantém a imagem geral da empresa, com vinhos elegantes, prazenteiros, fáceis sem serem corriqueiros. Ou seja, tudo em bom.
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O primeiro vinho a ser revelado foi o Lavradores de Feitoria Branco 2011, um vinho leve e fácil, que escorre perigosamente até à festa. Apresentou-se depois o Meruge Branco 2010, mais estruturado e desafiante, para servir com alimentos mais elaborados ou consistentes.
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Os tintos apresentados foram o Três Bagos Tinto 2008, a meu ver, o menos interessante do conjunto dos seis vinhos; o Meruge Tinto 2008, já com uma maior animação; o Três Bagos Grande Escolha Tinto 2008, que muito bem disposto me pôs; e o Quinta da Costa das Aguaneiras Tinto 2008, também muitíssimo belíssimo.
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Sem paciência para as empatas notas de prova, que basicamente não servem para nada, passo ao que me apetece dizer de mais concreto e sucinto:
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Lavradores de Feitoria Branco 2011
Origem: Douro
Produtor: Lavradores de Feitoria
Nota: 5,5/10
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Meruge Branco 2010
Origem: Douro
Produtor: Lavradores de Feitoria
Nota: 6,5/10
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Três Bagos Tinto 2008
Origem: Douro
Produtor: Lavradores de Feitoria
Nota: 5/10
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Meruge Tinto 2008
Origem: Douro
Produtor: Lavradores de Feitoria
Nota: 6/10
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Três Bagos Grande Escolha Tinto 2008
Origem: Douro
Produtor: Lavradores de Feitoria
Nota: 8,5/10
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Quinta da Costa das Aguaneiras Tinto 2008
Origem: Douro
Produtor: Lavradores de Feitoria
Nota: 8/10

segunda-feira, fevereiro 13, 2012

Quinta do Cardo Selecção do Enólogo Tinto 2009

Ora, chegou o terceiro mosqueteiro. Ando com vontade de abrir a janela e gritar: curto a Beira Interior! O branco, o de casta síria, parte-me todo, deixa-me à deriva, em prazer. Os tintos desta quinta não chegam lá, mas dão cartas… manilhas e reis.
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Que frescura! Carácter e pinta. Gostei mal o abri e senti os aromas… como o chefe corso, do Astérix, nota a aproximação da Córsega pelo olfacto… neste vinho a (minha adorada) touriga franca vem ao meu regaço, reencontrando-me. Ah, pois é!
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Ainda que só com apenas 20% do lote, a touriga franca apresenta-se logo, menos óbvia que a touriga nacional (60%). Depois vem a simpática tinta roriz (a tal que de modo persistente muda de nome nos rótulos), com os restantes 20%.
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A dupla de enólogos, João Corrêa e Nuno do Ó mais uma vez mostram que são mestres marceneiros… quero dizer, trabalham bem com madeira. Este vinho viveu 20 meses em barricas, colheu o que tinha a colher, tem-na lá, mas bem integrada e a jogar com a equipa.
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No nariz é rico, mostrando-se didáctico, com as notas fumadas, frutadas, florais e minerais. Na boca manda uma acidez… e com um final…
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Origem: Beira Interior
Produtor: Companhia das Quintas
Nota: 7/10
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Nota: Este vinho foi enviado para prova pelo produtor.

domingo, fevereiro 12, 2012

Quinta de Pancas Selecção do Enólogo Tinto 2008

Este amigo nasceu em Alenquer, terra de bom vinho, assim têm provado variada gente. Fresco, com estrutura, guloso. Um pacote de coisas boas, quer no nariz, quer naboca.
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Felicidade: a touriga nacional (50%) está mais próxima do Dão do que do Alentejo, mais floral e menos compota. O cabernet sauvignon (30%) force-lhe notas vegetais, mas nada de pimentão ou pimento, o que é fixe! O alicante bouschet (20%) deve lá estar a fazer qualquer coisa, mas que não sei o que é… não é ironia, é mesmo assunção de desconhecimento da minha parte.
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Tal como o mano do Alentejo, no nariz tem uma simpática vivacidade, com frescura no nariz, ao mesmo tempo que se notam os vegetais, um leve floral e a pimentinha (nada de pimento ou pimentão)… quiçá pimenta rosa. Esteve um ano em barricas, mas a madeira faz parte da equipa, não é a vedeta, quer no nariz, quer na boca. No palato mostra-se elegante, com um final catita. Corpo simpático… boa onda!
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Origem: Regional Lisboa
Produtor: Companhia das Quintas
Nota: 6/10
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Nota: Este vinho foi enviado para prova pelo produtor.

sábado, fevereiro 11, 2012

Herdade da Farizoa Selecção do Enólogo Tinto 2009

Hoje, amanhã e depois debruço-me sobre três vinhos da Companhia das Quintas. Começo pelo que menos me impressionou até ao mais catita, na minha opinião. São todos tintos, mas agora importa este alentejano.
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Não sei bem o que dizer… não tem nada a ver com a memória dos alentejanos clássicos, mas também não é o retrato-robô do que muito se anda a fazer por ali. Parece-me equilibrado nesse ponto. Reconheço que o modelo vigente me encanita um pouco, pois são muito globais, independentemente de serem bons ou não.
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Este tem, para mim, a virtude de não ser um tinto de barrar no pão… Isso é uma coisa bom. Menos boa é a frescura, pouca, que lhe notei. Assim-assim é o domínio de castas portuguesas, embora sejam fashion e de no lote haver syrah. Para ser preciso: alfrocheiro (30%), aragonês (30%), touriga nacional (30%) e syrah (10%).
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Gostei do arranjinho no nariz, com uma complexidade interessante, levemente especiado (talvez noz moscada, não juro), café, chocolate (preto, mas não absurdo) e ginja, mais do que a cereja indicada pela casa. Não lhe senti muito a madeira, o que é muito bom sinal, pois levou 18 meses em barrica.
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Gostei mais do nariz do que da boca, devido à pouca frescura… penso (quem sou eu? Enólogo não sou) que tal terá mais a ver com o território do que com a competência de enologia (João Corrêa e Nuno do Ó), com mais do que provas dadas. Aqui sim, senti mais a madeira.
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Resumando e concluando: tásse bem!
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Origem: Regional Alentejano
Produtor: Companhia das Quintas
Nota: 5/10
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Nota: Este vinho foi enviado para prova pelo produtor.

Constatação surpreendente

Há momentos em que um Moscatel de Setúbal dá cinco a zero a um Porto Vintage. Eram todos bons vinhos e de boa gente. Hoje assim foi: Companheiro Domingos Soares Franco… boa! Tásse muito bem!
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Nota: Foi na gala dos prémios da Revista de Vinhos.

terça-feira, fevereiro 07, 2012

Porta Fronha 2006

O Porta Fronha, felizmente, mudou de nome. Agora é Vegia, que soa muito melhor e faz mais forcinha pela marca, prolongando a presença mediática e comercial do Quinta da Vegia.
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Pois é! Outro dia fui à minha garrafeira preferida, a Garrafeira Campo de Ourique, e saltou-me à vista a colheita de 2006, ainda com a designação Porta Fronha.
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Bubi-u e gustei munto! Não me quero justificar nem avançar com bla-blás. O vinho está uma categoria, vivíssimo. Bom trabalho João Pedro e Teresa.
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Origem: Dão
Produtor: Quinta da Vegia / Casa de Cello
Nota: 7/10

domingo, fevereiro 05, 2012

Quinta de Sant'ana 2005

Quando escrevia para a revista Index, suplemento de sábado do jornal I, quis escrever acerca do vinhos desta quinta de Mafra. Todavia, complicações de agendas não o permitiram. Acabou-se a colaboração e foi-se o texto pretendido.
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Cada vez me espanto menos com a qualidade que têm vindo a revelar os vinhos da Estremadura (Lisboa) e do Ribatejo (Tejo), regiões em que gracejava como demarcadas do vinho a martelo. Tenho de dar o braço a torcer.
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Este tinto, resultante do lote de castelão (65%) e aragonês (35%), não é nem efusivo nem austero, mas moderado. Interessante no nariz como na boca. Não foi bebido quando foi novidade, mas este ano. É um colheita e dele não seria de esperar grande longevidade de jovialidade. Se bem que não é um vinho velho, a verdade é que também não estamos em época em que a moda se faz de lonjuras, especialmente nos colheitas. Este não mostrou sinais de qualquer cansaço ou evolução. Bem jovem sem aqueles frémitos, que a mim me no me gusta (ai, ontem foram umas estrangeiradas e hoje outras – devo estar mesmo doente).
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No nariz notas de ameixa, amoras, cereja, com finura de fumo. Na boca mostrou boa acidez e um final com demora.
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Origem: Regional Estremadura
Produtor: Quinta de Sant’Ana
Nota: 6/10

sábado, fevereiro 04, 2012

Quinta da Lagoalva Vinho Espumante Bruto

Espumante no Ribatejo? Por que não, se também o há no Alentejo? Cresci a pensar que os vinhos do Ribatejo eram carrascões, pesados, desequilibrados, de pintar as beiças, só tragáveis quando já se está com os copos.
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A verdade é que, desde a década de 90 do século XX, começaram a surgir vinhos interessantes, numa região com mais nome pela quantidade, através do trabalho do mestre João Portugal Ramos. Se os vinhos portugueses conheceram uma reviravolta bem positiva nos últimos 20 anos, o Ribatejo está a dar a segunda cambalhota, renascendo como Tejo.
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O trabalho de João Portugal Ramos tem sido multiplicado por vários enólogos sábios e dedicados. É o caso de Diogo Campilho, de 30 e poucos anos, que é responsável, com Pedro Pinhão, pelos vinhos da Lagoalva.
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A Lagoalva é uma quinta que prezo e acarinho, não apenas pela qualidade dos seus vinhos, não somente pelo complemento do seu azeite, não pelo apreço da tradição na criação de cavalos, nem tão pouco pelo que tem feito pela cortiça, mas pela gente que ali reina. Conheço três dos irmãos patrões, especialmente Manuel Campilho e seu filho Diogo.
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O Diogo parece ter o dom de fazer ouro onde põe a mão. Faz vinhos fáceis e muito bons. Disse fáceis, no melhor que a palavra tem, nada de simplório ou desinteressante. A aposta da casa é na qualidade, sobretudo na sua relação com o preço.
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Este é o primeiro espumante da Lagoalva e para estreia está estrelado. E se não fosse estreia estaria estrelado também. Bom prazer me deu bebê-lo.
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A parelha de enólogos escolheu uvas alfrocheiro e arinto, uma tinta e outra branca, uma mais forte e outra mais fresca. É um vinho fresco, suave no álcool (11%), que promete um verão supimpa. Bolha viva sem agressividade, guloso na boca, mais do que no nariz. Sobretudo muito easy going (palavras estrangeiras… estou doente!). Boa onda!
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Origem: Tejo
Produtor: Quinta da Lagoalva de Cima
Nota: 7/10

sexta-feira, fevereiro 03, 2012

San Joanne Passi L 2008

A Mafalda Félix aka Malvada (repare-se como a fonética resulta bem, com a real proximidade do F com o V) – alcunha que João Pedro Araújo lhe pôs, tal é o seu simpático e enganador mau feitio –, tantas vezes me moeu a cabeça que acabei por comprar o Passi. A recomendação da moça deriva do meu apreço pelos colheitas tardias, muito embora este vinho não o seja, pois resulta de uvas passadas fora da uveira.
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Nos Passi descubro sempre coisas novas. É um vinho leve e pouco alcoólico (10,5%), fresco… nasce na região dos Vinhos Verdes, mas está classificado como «vinho de mesa», pois é uma carta fora do baralho.
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João Pedro Araújo é um homem simpático com quem tive uma briga (não é bem) e que me quis bater (mais ou menos)... É clicar nesta hiperligação. Produz vinho na região dos Vinhos Verdes (Quinta de San Joanne) e no Dão (Quinta da Vegia), todo ele com uma ganda pinta.
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A quando do último Adegga Wine Market (não percebo por que a designação é em inglês) levei a passear duas Anas, a LD e a S. Logo à entrada, à direita, estava a banca do João Pedro e da Teresa, sua mulher… cumprimentei-os e evitei que as Anas chegassem ao Passi, disse-lhes apenas que terminaríamos a visita naquele estabelecimento.
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Assim foi e as duas Anas maravilharam-se com o Passi, sendo que a LD garante que o vinho que mais gostou até hoje foi mesmo este. Há gostos para tudo!…
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Não ostenta ano, mas o número do lote dá a perceber que é de 2008. É um vinho fresco, complexo e agradável, com aromas e sabor a uva, uva passa, algum mel, é untuoso, freneticamente guloso. Delicioso!
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Origem: Vinho de Mesa
Produtor: Casa de Cello
Nota: 8/10

quinta-feira, fevereiro 02, 2012

João à Mesa ganha prémio da Academia TWA

















– E o prémio para o melhor post do ano de 2011 vai para: … (ouvem-se rufos) … Esteva 2010, do blogue João à Mesa, publicado por João Barbosa!
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– (Um minuto depois, em palco) Obrigado minha gente, estou sem fôlego e nem sei o que dizer. Pensei sempre que nunca iria ganhar um prémio destes, escolhido pela Academia da blogosfera vínica… quero agradecer em primeiro lugar à minha mãe, ao meu pai, ao meu mano, à minha mana, às minhas primas todas, aos meus primos todos, às minhas três gatas, à minha prometida cirrose hepática...
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– (João Barbosa levado em braços pelos seguranças, pois nunca mais se calava, mas que mesmo assim continuou a palrar) Quero agradecer também ao pessoal da minha repartição de Finanças, aos bancários da CGD da Praça do Chile, ao Senhor Coimbra e à Dona São, que me recebem as amostras quando não estou em casa, às senhoras da lavandaria da frente, às senhoras da lavandaria do lado, ao senhor Luís, que é merceeiro o merceeiro do prédio…
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– (Pateada sonora) A sessão vai continuar agora com o prémio… (não interessa nada).
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Pois é, a malta do fórum The Wizard Apprendice fez umas votações, e não às cegas, para «O melhor blogue», «O melhor blogue revelação», «O melhor jornalista/crítico de vinhos» e para «O melhor post».
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«O melhor blogue» – Pingas no copo
«O melhor blogue revelação» – E tudo o vinho levou
«O melhor jornalista/crítico de vinhos» – Rui Falcão
«O melhor post» – Esteva 2010 / João à Mesa
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Fiquei também contente pelo segundo lugar ex-aequo, com Luís Antunes, na categoria «O melhor jornalista/crítico de vinhos», apenas a uma nomeação para empatar com o primeiro… Esta não perdoo à Academia... 
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E esta cena não deu presente material, nem dinheiro, nem estatueta, nem garrafa... fuinhas... facínoras... somíticos... canalhas... nem uma garrafa de Esteva...

Pai Abel Branco 2009

Ando há quinquénios para escrever acerca deste branco do simpático mestre Mário Sérgio Nuno, homem que se mantém fiel à Bairrada, não enveredando pela região da «Bairrada», aquela que despreza a baga e toma como sua os cabernet sauvignon, merlot, entre outras castas franciús.
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Neste caso não se trata dum tinto, mas dum branco. Mário Sérgio, fiel também aos processos produtivos bairradinos, cedeu um pouco à vaga, fermentando-o em barrica, onde também estagiou por seis meses … mas bem usadas, para que não marquem muito. Como manda a tradição, foi para o lagar com o engaço.
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O resultado merece um aplauso de pé durante dez minutos. Mário Sérgio Nuno não brinca em serviço… uma vez, antes de almoço, quis-me obrigar a tragar aguardente. Diga-se que, até hoje, uma das raras bagaceiras que consegui levar à boca foi a dele. E a aguardente vínica é outra especialidade.
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Este branco é um garrafeira, palavra que aparece «escondida» no contra-rótulo, pois Mário Sérgio tem experiência de confusões. Um dia surgirá o tinto, que provei, mas que ainda está inacabado. O nome pretende homenagear o pai, homem que conhecia correr, mas que aparenta ser tão francamente simpático quanto o filho.
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Resultante de uvas plantadas em cinco folhas diferentes, que foi adquirindo, este vinho resulta bem complexo. Este vinhaço fez-se com partes iguais de maria gomes e de bical. Tem acidez, mineralidade, notas vegetais, é, por isso, fresco. Mas também tem corpo. É «complicado» no nariz e na boca, muito rico, com final feliz (eheheheheh)… longo, bem longo.
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Origem: Bairrada
Produtor: Mário Sérgio Alves Nuno / Quinta das Bágeiras
Nota: 9/10

Mateus Rosé, um elogio






















Num país pouco sofisticado, o Mateus Rosé nasceu preciosidade. A par com o Faísca (mais tarde Lancers, da José Maria da Fonseca), o Mateus tirou vestes negras de viúva dos portugueses e arejou este país do «orgulhosamente sós». Se Portugal, durante a ditadura, era a preto e branco, o Mateus deu-lhe cor e logo uma improvável, a rosa.
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Chatos sem visão, pretensiosos e de mais enochatos e pedantes trataram de obscurecer este vinho tão (atipicamente) português. Enquanto lá fora manteve fama, sendo que em alguns países, como os Estados Unidos, é bem valorizado, por cá foi e é desdenhado por muita gente.
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Não sou exceção, mas, penso, que a idade me tem dado mais incertezas quanto à minha infalibilidade e, ao mesmo tempo, menos complexos. Tem-me tirado peneiras, basicamente. Gosto de vinho há mais de metade da minha vida, embora cota não sou velho.
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Era miúdo quando a Lisboa mais jovem começou a sair à noite. Comigo foi em 1986, tinha 16 anos. A noite tinha fauna, vestia-se e alindava-se, havia estilo e glamour. Os sítios eram alternativos e desejados; havia multidão ansiosa à porta do Frágil, onde a Guida (hoje na associação Abraço) impunha ditatorialmente quem entrava, naquelas duas salas pequenas, criando ódios e respeitinho (este menino era bonito e tinha estilo, nunca ficava à porta). Eu e a pandilha, sem dinheiro, sem fígado e sem estômago para uísques e vodkas, embebedávamo-nos com vinho. Era normal, não havia shots (que surgiram em 1991 – o Báltico, barzinho que frequentava-mos foi dos primeiros, quicá o primeiro, com os agora célebres cocktails B52).
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A vida tem-me mostrado a realidade. Reconheço agora a aleivosia, arrogância, pesporrência e impertinência da minha juventude, incluindo nos copos. Não tinha dinheiro para o que os «grandes» bebiam, pelo que ia vinho… mas Mateus, nunca!
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Já adulto, comecei a trabalhar como jornalista no Diário Económico (janeiro de 1990). Miúdo com piada e pinta, depressa adotado pelos seniores, mestres e ídolos. Os mais velhos trabalhavam e iam a bares sisudos. Não era farra, mas rotina. Sair à noite para tomar um copo num bar chato era o máximo, fazia-me adulto. Eram templos admiráveis aos olhos sensíveis duma criança de vinte anos que quase só conhecia discotecas e tascas. Havia vinho ao jantar, mas nunca Mateus.
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Homem feito e enófilo preconceituoso e pretensioso (espero estar curado) tinha vinho em casa. Mateus? Blheck! Credo, não! Mas a vida mudou. Ou melhor, muda-nos, abre-nos os olhos. Bate-nos, dá-nos estalos, chama-nos burros, estúpidos. Sevícias que nos damos a nós mesmos.
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Quando fiz o programa «Da Terra ao Mar», da RTP 2 (junho de 2004 a maio de 2007 e de junho de 2008 a maio de 2009) passei a lidar muitíssimo mais de perto com a gente do vinho. Conheci malta que me ensinou, tirou dúvidas, que simpática e educadamente me deu raspanetes, com paciência e com o prazer (aqui tenho de mandar um forte abraço ao Paolo Nigra, fundamental pelo grande aprofundamento do meu prazer com vinho). Com essa gente, com quem hoje lido muito mais de perto, aprendi a respeitar os vinhos de grande produção. Gente que me trouxe, aos dias, a dimensão dum Mateus Rosé ou Lancers ou doutro block buster.
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Com imensos enólogos comecei a compreender que não é toda a gente que faz um bom vinho, mas que um bom vinho se faz com boas uvas e/ou com bons meios e material funcional. Com imensos enólogos comecei a compreender que um vinho de qualidade, que todos os anos tem de manter um padrão e um perfil, independentemente das condições, naturais é uma obra do caraças! Tal como a arquitetura, a enologia é uma arte, mas é sobretudo uma disciplina técnica.
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Fazer Mateus Rosé não deve ser, por isso, trabalho para qualquer um. É possível enganar todo o mundo. Mas não é possível enganar todo o mundo para sempre. O Mateus terá tido evoluções de padrões, mas não engana. Mateus Rosé é Mateus Rosé, se vende o que vende, anos e anos, e está aí para as curvas, tem mesmo de ser bom.
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Não, o Mateus não é um vinho de château, embora se ilustre com a setecentista Casa de Mateus, obra do arquiteto Nicolau Nasoni, residência dos condes de Vila Real. Só no seu início houve ligação profissional entre a família Guedes, produtora do vinho, e a Sousa Botelho e Albuquerque. As relações amargaram, mas isso para aqui não interessa. Não é um château nem pretende ser. É um vinho para quem se marimba para as denominações de origem controlada, para as colheitas, para as castas. Mais do que um vinho, o Mateus é uma bebida. Podem os marketeers da Sogrape dizer mesmo, e com razão, que é um estilo de vida..
Repito: Podem os marketeers da Sogrape dizer mesmo, e com razão, que é um estilo de vida. A publicidade sexy, relaxante, com gente de bem com a vida, estilo e sofisticação não mente. É para isso que serve o Mateus. É para as festas! Tem pouco álcool (11%), não é para chapão involuntário no tanque. É para as conversas com gente gira e interessante que não quer (pelo menos nesse momento) discutir o papel da estética nas sociedades ocidentais contemporâneas após a queda do Muro de Berlim e até ao 11 de setembro. Como agora me apetece verão, proximidade da praia, piscina, noite, luzes, música alta, descontração e miúdas giras para seduzir (bah, quero lá saber que seja sexista e marialvista).
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A descontração de Mateus é pensada. Ainda que no início pudesse haver uma certa ingenuidade, a verdade é que tudo foi pensado. E bem pensado, porque bateu certo. A imagem da tradição vinícola e do bom-gosto e estilo do palácio de Mateus e a forma arrojada da garrafa. O cantil, forma Mateus muito imitada pelas concorrências, é antigo, foi ressuscitado para este vinho. Os rótulos evoluíram, modernizaram-se na continuidade. Confesso que gosto mais do look com maior destaque para a casa, mais antigo.
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A marca vale uma mina de ouro, razão pela qual na década de 90 surgiu a gama Mateus Signature, de posição bem acima nas prateleiras, que se pretendia ascender. Não foi eficaz, mas melhor têm corrido os Sparkling e o Aragonês (provavelmente no mundo deve chamar-se tempranillo). Mas Mateus, Mateus, é o clássico rosé sem casta identificada, sem ano de colheita, sem região, sem peneiras, mas com estilo. Serve-se fresco, diz a Sogrape. E serve-se, nunca experimentei ao natural nem me parece que algum dia o faça.
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Adoro o aroma a rebuçado de morango, a frescura na boca, o gás que ali faz mesmo parte.
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O Mateus é como o James Bond (para elas) ou como a Cat Woman (para nós): não é para casar, mas para ter casos, pura diversão sem consequências...
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Muitos podem admirar-se com a nota que vou dar a este vinho. Relembro que a escala é subjectiva e está sujeita ao prazer dado. A qualidade é sempre tida em conta, e isso aqui não falta. Quem tiver preconceitos ou quiser implicar, que tenha chuva durante as férias de verão.
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Origem: Vinho de mesa (Portugal)
Produtor: Sogrape Vinhos
Nota: 7/10

quarta-feira, fevereiro 01, 2012

Arruda Garrafeira 1970

Há uns meses, ou há um ano, escrevi um texto, publicado na imprensa, acerca da Quinta de São Sebastião. Nele referi a estória da encomenda feita ao enólogo Tiago Carvalho. Às cegas deram-lhe um vinho novo e outro com idade. O desafio era o de fazer algo que sugerisse a junção dos dois.
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Contou-me Tiago Carvalho que o vinho idoso lhe lembrava algo do Barca Velha, mas que, definitivamente, não era. Após o primeiro embate percebeu que não era esse famoso Douro. Mas o que seria?
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Compreendido o caderno de encargos revelou-se o embuçado. Tratava-se dum tinto da Adega Cooperativa de Arruda dos Vinhos. Espanto! Tiago Carvalho disse-me que tivera assim a prova de que se podem fazer grandes vinhos numa região em que ninguém dá muito por ela. Mas como também referiu, não será por acaso que a palavra «vinhos» faz parte do topónimo.
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Fiquei com essa na cabeça e, como não duvido de pessoas sérias, fiquei sonhando com o momento em que uma dessas perdizes me passasse frente à caçadeira. Um ano depois da conversa, tau! Duas aves raras abatidas. Todavia não sei se o ano da colheita era o mesmo.
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Outro dia a Mé e o Tiago vieram cá jantar. Como prometido anteriormente, trouxeram duas botelhas que, todavia não se abriram nessa noite. Passado um mês, ou coisa que o valha, vieram novamente e disparou-se o saca-rolhas.
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O Tiago, que tem uma coleção destas garrafas, já me avisara que, de vez em quando, uma sai errada. Normal, pois a idade trata de tratar (foi de propósito) de modo diferente diferentes (foi de propósito) exemplares. Claro está que as duas estavam desfasadas.
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Uma mais enrugada, sem qualquer brutalidade, e outra muito polida e elegante. Quer numa quer noutra, a cor mantinha-se jovial. Já com aromas terciários, mostravam notas verdáceas. Cada uma com seu carácter.
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A garrafa traz um colar, dum lado com as cores da bandeira da República Portuguesa e, doutro, as de Itália. Ao centro, um círculo dourado com o dizer: Concurso Enológico Internacional – Itália 1984. Não sei que concurso possa ser e deduzo, pela cor, que tenha ganho uma medalha de ouro… sendo que não ligo bóia a tal coisa, mas neste particular achei que o devia referir.
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Quem as vir passar que lhes passe uma rasteira e as levante, agarrando-as sem as largar. Trate-as com carinho e dê-lhe finanço.
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Origem: não referida (A Arruda dos Vinhos situa-se na atual região de Lisboa)
Produtor: Adega Cooperativa de Arruda dos Vinhos
Nota: 7,5/10 e 8/10